Há as chamadas pessoas normais, há os tontinhos e há os outros. É precisamente à volta destes últimos que gira esta crónica.
Os outros são uma espécie de gente que apesar da aparente normalidade, têm uns acessos de demência ocasionais que quanto mais não seja causam alguma preocupação.
Tudo começou com uma ideia do Faísca (este gajo até as sonha) de se fazer um ataque conjunto ao Caramulo (vá-se lá saber que mal é que a serra lhe fez). Como (e isto não deixa de ser preocupante) há pessoas que não conseguem identificar a insanidade de um gajo à primeira, prontificaram-se logo a acompanhá-lo. Assim nem pestanejaram quando a data foi escolhida – 1 de Dezembro. Quando se soube a previsão do tempo para esse fim-de-semana e principalmente para esse dia – uma vaga de frio, muita chuva e possibilidade de neve nos pontos mais altos, alguém se importou com isso? Naaaaaaa. - É só para ir fazer companhia ao tontinho, mais nada, – disseram alguns, - é que já estava marcado – disseram outros, - o ponto de encontro é às 10 da matina com este tempo? Olha que se lixe vou ficar é na caminha – disse ainda o Marco Fortes, mas mais alguns terão dito o mesmo.
Admito que fui um dos que foi só para fazer companhia ao tontinho, não fosse ele perder-se e eu é que tinha o GPS…
Saí da cama às 5.30.
Até à chegada à casa do xôr perlesidente há um vazio temporal que não consigo preencher. A minha chegada foi saudada com um – ISTO É QUE SÃO 6 HORAS???
E pronto, acordei logo. O João já lá estava e entretanto chegaram o Valter e o Gilberto. Estes 2 sempre atrasados. Uma vergonha…
A nossa chegada a Vila Nova de Monsarros foi rápida. Em pouco tempo estávamos prontos a partir, nós e a chuva que certamente estava à nossa espera, a grande #?#$&%!!#?/$
Entretanto o Valter já havia percorrido a rua principal 3 vezes ao pé-coxinho, fazendo o aquecimento necessário para o que havia prometido dias antes. Ao meu inocente comentário –estou a ver que vou passar mais um dia a gritar “ANDA VALTER HUGO”, respondeu prontamente – só para ti, subo aquilo tudo só com uma perna. Este homem tem uma determinação de ferro, fosse a perna em questão feita do mesmo material e seria um caso sério.
Lá partimos com algum atraso, mas cheios de vontade de subir a serra.
Uns quilómetros à frente a chuva parou, e o dia acordava, tal como o sol, sendo que este cheio de sono deve ter voltado para a cama uma vez que só o voltámos a ver no fim do dia.
A viagem foi decorrendo sem incidentes de maior e à medida que se subia, o frio aumentava proporcionalmente e era de cortar as orelhas. Curiosamente no caso do Hernâni não seria o frio que lhe viria a cortar a dita, mas já lá vamos.
Chegados ao Moinho do Pisco a neve apareceu pela primeira vez. Entretanto na passagem de uma poça de água, o Valter esquecera-se completamente do apêndice que transportava (leia-se a perna que só ia a estorvar) acravou o pezinho na água, que com este frio, é do melhor para acordar. Claro que alguém tinha que levar com as culpas, calhou-me a mim que ia ali ao pé, mas tudo bem.
Daí até ao Boi (o local de encontro) ainda se nos juntaram dois amigos de Águeda, um de Anadia e Paulo de Canelas. Um abraço a estes bravos que subiram a serra quase toda sozinhos, o que com este tempo é de homem.
À chegada ao Boi nevava intensamente. Fui recebido com uma bola de neve atirada pelo Candinho Valentintim, que distribuía fruta a tudo o que mexia.
Como não conseguimos comunicar com a frente de Tondela (que também lá esteve mas um pouco mais tarde) seguimos então em conjunto com o pessoal de Mortágua com destino a Malhapão de Cima. Esta foi a parte mais espectacular, uma vez que todo o percurso foi feito debaixo de um nevão intenso e a abrir caminho pela neve.
Entretanto seguia na roda do Valter (que já estava a utilizar as duas pernas, por uma questão de equilíbrio ao que parece) e à minha frase de incentivo – ANDA VALTER HUGO, responde com um – não posso, não tenho tracção…
Escusado será dizer que esta foi uma das frases mais ouvidas no resto do dia, pfffffffff.
A 1 quilómetro de Malhapão a frente de Mortágua resolveu iniciar a descida. As condições climatéricas estavam de facto muito agrestes.
Os “outros” (cujo frio nos mantinha meios dormentes ou melhor dizendo meio dementes) continuaram até local de almoço. A garrafa de jeropiga que nos acompanhava encontrava-se vazia e necessitava de uma recarga.
Um lume enorme esperava-nos bem como umas moelas e um pica-pau quentinho. Tudo isto foi devidamente acondicionado com vinho e uma aguardente com mel que era de estalo.
Foi então tempo de vestir uma roupa seca para a descida que se previa bem fria.
Entretanto o Candinho secava com afinco o casaco que julgava ser seu. Viria a descobrir mais tarde que o mesmo pertencia ao Esgalhado, acabando por descer a serra com o seu molhado. É assim que se criam pelos no peito.
O regresso foi-se fazendo sempre na companhia de uma paisagem deslumbrante. De facto a serra coberta de neve tem qualquer coisa de mágico, a que ninguém consegue ficar indiferente.
Já com Monsarros à vista o Vítor e o Hernâni na zona espectáculo, não se fizeram rogados e presentearam-nos com um belíssimo bosogui quase em estéreo. O Vítor levantou-se quase tão rápido como caiu. Já o Hernâni demorou-se mais um pouco e enquanto se levantava ia insultando o eucalipto que lhe fez um corte na orelha. Como se vê nem só o frio corta as orelhas, os eucaliptos também e com a vantagem de o fazerem de uma forma muito mais espectacular. Uma saudação especial para esta dupla de amigos, que sendo os menos novos da missão conseguiram de uma forma peculiar passar a todos uma valiosa lição de vida. Quando se cai é preciso levantar e seguir em frente. Uma inspiração para todos dirão alguns, uma risota dirão outros.
Seguiu-se o banhinho quente e o lanche no café onde tudo havia começado umas horas antes.
Agora mais a sério, um abraço para todos os que participaram nesta aventura e em especial para o Tó Faísca pela iniciativa que teve, tendo conseguido juntar um bom número de “outros” lá em cima. Parece que para a primavera vamos lá outra vez. O Caramulo que se cuide.
Encontrar-nos-emos por lá.